domingo, 27 de dezembro de 2015

O POEMA MAIS RIDÍCULO DO MUNDO

“Como você consegue escrever tanto?”, ela disse.

“Eu vou comendo a vida e
cagando poesia; é natural”, eu disse.

Ela estava na minha cama, nua,
Enquanto eu digitava no computador.

“Pronto. Terminei. Veja o
Que você achou...”

Ela leu. Depois leu de novo.

“Tá uma merda”, ela disse.

Estava mesmo. Publiquei no meu
Blog que ninguém visitava.
Aquele poema era feio demais.
Decidi desligar o computador e
Tentar outro dia, depois de
Fazer amor.
Quem sabe assim eu faria algo
Cheiroso.
No dia seguinte escrevi sobre
Rosas e abelhas.
O poema mais ridículo do mundo.
Algo como:

“As abelhas amam as rosas
E as espalham pelo jardim;
Regar-te a alma incólume em amor
Pra que floresça um sorriso enfim

O sol deita-se em véu esmeralda
Na casa das paixões, a longa distância
Que eu percorro até teus abraços
Os beijos que na cama dançam

Abraça-me num silêncio
Secam-me as lágrimas moídas
Que te gritam na despedida
Ansiando teu corpo em minha vida”

Ela gostou do poema. Deu-me um
Beijo, um aperto.
Todo mundo é ridículo
Quando está apaixonado.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

SOBRE ISTO EU NÃO QUERO FALAR

“Por que você não me ama?”

“Eu amo você.”

“Ama nada!”

Sim, ela estava certa. Eu não amava
Nada além das paredes e da cor preta.

“Até quando você vai continuar essa palhaçada?”

Iria continuar até ela se cansar de mim.
Todas se cansavam, só que com ela seria
Diferente.
Não iria tentar agradá-la com um “eu” que
Não existe.

“Eu sou isto daqui, mulher.
Sou minhas páginas em branco, minha
Ausência, meus pêlos na barriga,
Meus peidos embaixo das cobertas,
Minha folga, minha liberdade,
Minhas banhas.”

Ela me olhou.


Há quase um ano que ela não se cansa de mim.

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

FELIZ DIA 25

Nossa árvore foi montada de sucata.
Seus galhos são amarelo-ganância.
Pequenas indiferenças
Servem de enfeite
Junto às luzes laranjas
Que muitos não têm.
O topo da árvore pega fogo.
Morre gente, morre bicho
Morre cultura.
Na base há caixas de papelão
Serão pegas por alguém
E vendidas por algumas moedas.
Cada homem é uma estrela
E cada estrela é da morte.
Cada morte um presente
Para escapar das vésperas
Do inferno.
Você tem sido um bom garoto?
Comeu toda a lata de lixo?
Muito bem! Papai Noel
Trará suas pedras
Pra você fumar.
Quando você quiser agir
E abraçar alguém
Não espere a meia-noite.
O relógio não liga pro homem,
Não se importa...
Os bancos se importam.
As lojas, a televisão,
O governante.
Até o deus-sol, que morreu
No seu aniversário e
Renasceu profeta.
Se é falso ou não, siga o amor
que ele prega.
Mesmo com toda crueldade.
E não esqueça,
Depois de tudo isso, que

Todo mês tem um dia 25.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

UM CONTO DAS COISAS

  Ele era um cara interessante. Cansou-se da mesmice, pôs os pés na estrada. Sem passagem de ida e muito menos de volta. Passou por aí, por lá, por aqui e por onde fosse. Viu gente, viu tantas coisas que enciclopédias sentiam inveja dele.
  Voltou numa sexta-feira. Bebemos em um barzinho, em um centro qualquer de uma cidade qualquer.
  - Eu vivi, meu amigo – ele começou. – eu acho que aproveitei tudo o que tinha pra aproveitar nessa vida. Poderia morrer agora!
  - Sério?
  - Nunca estive tão certo disso. Eu vi o sol nascer na neve, no deserto, nas praias e nos prédios. Vi vulcões, tornados, tempestades e terremotos. Conheci todas as religiões, todas as culturas. Não há mais nada para ver aqui.
  Pedimos outra garrafa de cerveja. Custava sete reais.
  - Eu queria ter sua coragem, cara – eu disse.
  - Não é questão de coragem; é de necessidade. Eu aproveitei a vida.
  - Parabéns, amigo. Estou orgulhoso.
  Bebemos mais um pouco. Ele pediu um cigarro meu. Custava sete reais o maço.
  - Eu vi tanta coisa, amigo – ele confessou – mas ainda não entendi o propósito da vida. Tantas religiões diferentes, pregando coisas diferentes, motivações diferentes... Não sei se tenho que lutar, se tenho que orar, se tenho que amadurecer o espírito...
  - Você tem que me passar o isqueiro...
  Ele passou. Acendi meu cigarro.
  - Tantas coisas eu vi. Vi a morte, o amor, a escravidão, a fome, compaixão. O que é certo? O que é errado?
  - Errado é você acender o cigarro do lado contrário...
  Olhou para o filtro que queimava e soltava um cheiro de papel higiênico queimado.
  - É tudo tão complexo, tudo tão complicado e tão vasto. Acho que a vida não cabe em mim. E quando eu paro para pensar na minha viagem, sinto que, no fundo, ainda não estou completo.
  Não prestei atenção no que ele estava dizendo porque uma ruiva bunduda e tatuada passou olhando para mim. Essas oportunidades de flerte JAMAIS devem ser desperdiçadas.
  - O que você disse? – perguntei.
  Ele ficou me olhando com cara de bosta. Era tão infinito, mas ainda assim era um homem, que morreria (com sorte) aos oitenta anos. Ele mijava, cagava, andava e falava. Tinha dedos, unhas, pelos no nariz e na bunda. Era tão humano quanto eu, não importava o que ele fizesse. Estava vulnerável às mesmas coisas que eu. Os outros o viam como uma divindade; eu o via como um cara interessante, que viajou o mundo e viu coisas.
  - Sinto inveja de você – ele contou – você é tão simples.
  - A vida é simples. Você vive e morre e faz coisas no meio. Pronto. Quer mais uma cerveja?
  Pedimos mais uma garrafa. Essa ele pagou; custava sete reais.

FODER É BOM

Saia da minha cabeça e
Entre na minha cama
Prefiro ter seu corpo
Para lamber
Do que seus beijos
Para recordar
Eu quero chupar tudo de você
Tudo mesmo
Todo fogo, todo o stress
Toda a tristeza
Mas não vamos falar disto
Aliás, não vamos falar
Que isso seja um monólogo
De dois amantes que viraram um
Com gemidos poéticos e
Toda a graça dos nossos órgãos
Penetrando, penetrando, penetrando
Até nós esquecermos
Que somos mortais
E que ainda estamos distantes.
Quando você se for, por favor
Feche a porta e volte para

Minha cabeça.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

DESCULPAS AOS MEUS QUERIDOS (E À MIM)

Eu sei como
Magoar pessoas
E essa é a habilidade
mais inútil de todas
Magoei uma amiga
um primo e uma mulher
Magoei minha cama, minhas paredes
meus cigarros, meu café e
meus poemas
Não me faça te magoar
É como dar um soco
Numa parede de pedras
E limpar o sangue com álcool
Não me obrigue a fazer isso
Assino essas obras tolas com
lágrimas
Não traga o meu filho da puta interior
pelo bem dos nossos momentos
Eu queria saber fazer
silêncio
Queria que o mundo se calasse
Que a desigualdade não existisse
e a maldade fosse fase
Largada nas infâncias dos fetos
Para que não fosse preciso
Saber o que é mágoa.
Queria saber voltar no tempo
e morrer todas as vezes que
fui um idiota
Mas aí eu não aprenderia nada
E não entenderia as coisas
Me perdoe por ser burro
Me perdoe por ser violento
estúpido,
mentiroso,
Hipócrita, tonto, chato, viciado...
E cá estou eu me magoando!

ALMA XXX

Estimule o clitóris da sua alma
Lamba-o, toque-o
Babe nele
Com carinho; é sensível
Mas vá até o fim
Chupe-o até sua alma suar
Até ela não aguentar mais e
explodir
Aproveite o momento
Sua alma é sua parceira
de eternidade
E você é o corpo, a língua,
Os dedos.
Não seja egoísta
Não fique se masturbando em materialismo, em coisas fúteis.
Dentro do seu carro moderno com
suas roupas novas.
As pessoas não sabem fazer a alma gozar
E estão todas carentes.
Todas tristes.
Uma boa trepada com a alma
Desintoxica, reanima.
O squirt dela vai escorrer até o
seu cérebro
E te fazer gostar da vida.

MANCHANDO CONFISSÕES

Você já se confessou?
Eu me confesso todos os dias
Nos abraços
Nos prédios que olho
Nas mentiras
Minha onisciência
É limitada aos meus erros
Que eu apago a cada trago
Tá tudo meio borrado, sabe?
Tudo sujo, uma grande mancha
Preta e sem graça
Poderia ser um poema,
Poderia
Sei fazer belos borrões
Isso seria arte
Seria vendida por milhões de euros
Numa exposição na Europa
“Confissões de uma mancha”

Desculpa, estou blasfemando
Ante a escrita, minha pastora
E nada me faltará
Quantos tragos, senhor?
Quantos tragos para

Pagar pelos meus pecados?

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

TEIMOSO ORGULHO

O orgulho é meretriz
Cobra ego pra satisfazer
O vazio
Encha a taça
Do champanhe estourado
As horas que se perderam
Espumam na sua boca
Parabéns pra você
Que tem mente fechada
Acorrentada ao medo de
Estar errado
Onde estão seus amigos?
Quem são seus amigos?
Aqueles que aplaudem
O seu achismo?
Então se ache perdido
Sozinho, humilde
O céu olha pra você o dia inteiro.
Sua existência é pó,

varrida pelo tempo.

RIMA DE UM PESCADOR

Felicidade é escama, presa na lâmina
Agora minha comida está suja de lama
Não tem nada pra se ver ou tentar comer
Tudo o que é vivo um dia vai morrer
Mas desse jeito não dá, só sujeira pra pescar
Pesco as ilusões que vai tudo melhorar
E agora, quem paga essa rodada?
Um shot na cabeça de mãos atadas
Traz o céu mais pra perto
Pago imposto, tudo certo
Vida de inseto, o caminho é incerto
O metal da ganância deixou o rio quieto.
Os pilares sociais não se sustentam
São as barragens gulosas dos que ostentam
Podia melhorar, mas eles não tentam
E agora é tarde para ficar atento
A água tá na lama e o pescador no lamento.

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

CRISE EXISTENCIAL

Na chuva, uma gota de lágrima
Não vale nada
Eu pensei numa solução:
É só continuar vivendo nesse lixo
Nessa merda violenta
Com esses filhos da puta
Limpando a bunda com os impostos
E ninguém ligando pra ninguém
Que as crianças irão chorar
E chorarão tanto que
Daria para encher uma represa
A crise hídrica acabaria.
Mas nós temos outras crises
A crise amorosa
A crise religiosa
A crise política
A crise humana...
A única coisa que diferencia
O homem das outras espécies
É sua capacidade
De foder com tudo.
É melhor deixar esse planeta
Para as amebas
Talvez elas aprendam a amar
E o amor delas será muito melhor

Do que o nosso.

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

COMO SER FELIZ

Veja as cores
Se não puder ver, toque
Se não puder tocar, cheire
Se não puder cheirar, chore
Depois beba
O medo de viver
Que se foda
Perca um amigo. Perca dois.
Quebre uma garrafa, um osso
Lamba o chão
Fique de cama. Fique de coma. Fique de quatro
Coma mulheres, homens, chocolate
Porcos, vacas e aves
Coma Deus
Vomite tudo em cima de uma obra
Nos seus poemas
No túmulo dos seus pais
Apaixone-se. É o nível mais seguro
Antes da depressão.
Faça um bolo de fome, com cobertura de sede
E coloque numa conta untada com manteiga
Depois sorria.

Você consegue.

sábado, 14 de novembro de 2015

PUTARISMO

Eu sonhei que transava com uma puta
Eu dizia a ela: “Não precisa ficar nessa
Posição humilhante. Venha, deite-se.
Farei massagem em você.
Você está toda suada,
Cansada
E essa vida é um lixo.”
Ela não me respondia
Era uma boneca de pano remendada
Com muitas histórias para contar
E uma bela 
bunda 
loira.
Ela então disse, nobre:
“Você tem 30 minutos, queridinho.”
Quando eu acordei, eu ainda estava só
Olhei no espelho e descobri que
Somos todos putas
Vendendo nossos corpos
Para esses mentirosos
“Você está atrasada, vadia!”
“Oito horas minhas são 33 reais”
"Fique de quatro e puxe meu saco!"
"Se não trabalhar direito eu não pago!"
“A casa está vazia”
Fiquei ali, pensando, sem vida


Eu ainda tinha 30 minutos.

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

EM QUEM CONFIAR (SEGUNDA OPÇÃO)

Confie em seus pais
enquanto eles estão vivos
e você pode confiar neles
Não confie nesses vazios
que te dizem "eu te amo"
olhando fundo
para suas roupas
Não confie nos certinhos demais
Eles nunca erraram e você pode
ser o primeiro erro deles
Não confie nos preconceituosos
Eles podem matar seus filhos
Me diga com quem você anda
que eu te direi "ande mais"
Confie nesses que transbordam os copos
mas te ajudam na ressaca
Estes, e somente estes
Merecem respeito e
um pouco
de amor

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

RUA ALTERNATIVA

Nós somos um grito
uma liberdade que está realmente
livre
é por isso que podemos dizer
essas coisas de compaixão
Estamos na rua onde tudo acontece
e já aconteceu
está acontecendo
nos atiramos nesse poço
juntos
e saímos sujos de aprendizado
Os mais velhos reclamam da
sujeira que fazemos quando o violino chora
e o poema é largado numa mesa
Vendemos sorrisos, cobramos abraços
e os seguranças nos expulsam
mas nós podemos fazer qualquer coisa
somos aquilo que está entalado na sua garganta
e que a gravata não deixa escapar
Tem uma placa aqui, pra onde caminhamos
ela diz:
"Bem-vindo à você mesmo"

Então está tudo bem
se você se perder.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

JAULAS DE ÓDIO

Nossas jaulas são invisíveis
Feitas de ódio fundido
e medo temperado
Quem tenta voar, voa para o hospício
Para debaixo da ponte
Nossas jaulas são invisíveis
Ninguém pode tocar na jaula do outro
Pois isso seria loucura
E ninguém aqui é louco, não?
Eu vi alguns pombos voarem
quebraram o sol num vôo estranho
Estavam livres
Mais livres que os intelectuais
Mais livres que os capitalistas,
os comunistas, os extremistas
os idiotas
Nossas jaulas são invisíveis
Porque queremos ficar longe
um do outro
Sem dizer isso sinceramente.

sexta-feira, 6 de novembro de 2015

EU ESTOU CERTO E VOCÊ ESTÁ ERRADO

Nós apoiamos, eles condenam
Nós amamos, eles odeiam
Nós aceitamos, eles recusam
Nós recebemos, eles recrutam
Nós ajudamos, eles atrapalham
Nós sorrimos, eles gritam
Nós conquistamos, eles roubam
Nós somos modernos, eles são trogloditas
Nós pensamos, eles manipulam
Nós somos o "sempre", eles o "nunca"
Nós acertamos,  eles erram
Nós somos o agora, eles o que era.

E nessa guerra de apontar dedos
Não há um que preste.
Vá viver a porra da sua vida

E deixe os “Nós” e os “Eles” em paz.

PAIXÃO DE UM PEDRO

Com o cachimbo aceso
Pedro entorpeceu o mundo.
Não era mais um esquecido numa calçada
Uma piada sem graça
Sem histórias e vitórias
Jogado no fosso dos solitários
Pelas mãos tiranas da desigualdade
Não ouvia mais os pais que nunca o foram
Rindo de seus dedos queimados
Pedro, por essa noite, era Deus

Crucificado nos próprios vícios.

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

PESSIMISMO APOCALÍPTICO

Então eu vejo uma terra seca
fome flertando com a sede
e caixas de papelão
abrigando um recém-nascido
vejo armas no rosto
de mulheres e seus filhos
bombas recebendo aplausos
idosos morrendo depois dos netos
a paisagem é vermelha
pintada em sangue
emoldurada com os ossos
de um salvador
vale alguns trocados
e uma pedra de crack
para você entender
o que caralhos está acontecendo



Afundo-me na cama
esperando os pesadelos;
o único momento onde
eu não me sinto louco.

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

ALGUM MOMENTO NOSSO

Ele estava tão bem que mal conseguia apagar o cigarro. Tirou o próprio tênis e matou a bituca como se fosse uma barata perdida. “Morre, desgraçado! Morre!”, repetira roucamente com voz de doido. Eu balançava o seu ombro, gritando para ele parar de ser retardado, conseguindo (de forma muito a desejar) segurar a gargalhada iminente. Nós tínhamos apenas uma noite à mais, com uns punhados de sorrisos e umas doses de conversas profundas sobre a vida. 300 ml de vinho e 200 ml de uísque. Uma cerveja que mornava em qualquer canto junto à um violão que gritaria a trilha sonora daquela noite.

“Toca Legião”, alguém sugeriu. Era sempre Legião. E então todos uivaram (uns mais afinados que outros) sobre o que foi escondido e o que foi prometido.

Este momento eu nunca esquecerei. Talvez porque ali, naquela loucura, as coisas faziam sentido.

domingo, 18 de outubro de 2015

APROVEITE ATÉ OS DOMINGOS

O dia se esfolou numa garoa fina, daquelas que gelam as espinhas preguiçosas. O calendário do celular (modelo novo, coisa cara) marcava um domingo. David esticou-se na cama, os olhos grudaram por tempo seco. Sentiu, olhando para o cinza da janela, que seria um feriado de ócio. Há tempos David não vivia. Seu diário (um pequeno caderno de capa vermelha) era tão cheio de anotações quanto um cadáver é cheio de vida. Tentou escrever algo, mas de nada tinha para pensar; quanto menos para escrever. Anotou "Foda-se" caoticamente pela folha, com traços agressivos e um tom suicida, rasgando um pouco a página. Ouvira numa música que devemos nos perder às vezes. E ele amargava por isso ansiosamente. Sair pela estrada, num clipe de uma música alegre, sendo quem ele gostaria de ser, vendo cores pela paisagem vazia. O sol brilharia para ele levantar os braços e gritar que conseguiu o que queria.
Estava sentindo dores no peito há alguns dias. David morrera ontem.

EU SEI QUE É ERRADO MAS EU FAÇO

Tem algum sangue neste prato
Que eu não posso engolir?
Tem alguma história aqui
Que não deveria terminar?
Talvez uma suplica de um
Inocente solitário, no cárcere
Sirva a pele para enfeitar
Minha cultura de se mostrar
Mais chique do que o outro
E que não caia um, caiam bilhões
de cabeças degoladas em lágrimas
e couros esfolados
Para satisfazermos o pódio
Onde somos os primeiros,
Onde somos os melhores hipócritas,
os maiores mentirosos sujos
Porque enquanto eu grito
para que parem
eu continuo
evoluindo na cadeia alimentar.

quarta-feira, 7 de outubro de 2015

PÓS-FUTURISMO

Eram unidos como óleo e pipoca
Sentiam que não precisavam de nada mais
Como dinheiro, segurança, saúde, vento
cigarros ou vida
Eles poderiam queimar paisagens em velas
Ou da Lua sorrirem à Terra
Porque ostentavam-se
E todas as páginas anunciavam,

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confeitadas de curtidas fake
A simetria perfeita
Mas eram tão destrutivos, coitados ):
Dois furacões brigando por uma cidade
Acabaram que, de tão poderosos
destruiram-se em si mesmos
Vendo que a jornada
não é um sonho
não é um sonho
não é um sonho.
Wake up, e entenda que o amor <3
Não é luxo
É necessidade.

terça-feira, 29 de setembro de 2015

NA ESTRADA

As linhas da estrada eram infinitas
Cortavam o asfalto,
e o asfalto cortava a paisagem,
E a paisagem cortava a janela
Onde repousavam meus olhos
que teimavam, sobre efeito de
noites mal-dormidas e lágrimas,
em continuarem abertos.
O ônibus trepidava
ultrapassando um veículo lento.
Estradas foram feitas
Para serem pintadas
com pé e marca de pneu.
Vá embora, na arte de se estradar
E suas histórias viverão para sempre.

Enquanto a cidade ficava próxima,
as palavras no fim se aconchegavam
E o ponto final
cortava o
infinito.

domingo, 20 de setembro de 2015

COMO FAZER ARROZ

Pense nela.
Adicione alho bem picadinho à panela 
com uma pitada de óleo. 
Imagine ela sorrindo. 
E quando começar a dourar, 
adicione o arroz e o carinho.
Pergunte a si mesmo o motivo 
dela não estar ali agora.
Esqueça.
Mexa o arroz por uns dois minutos, 
então jogue a água 
até cobrir dois dedos acima dele. 
Abaixe o fogo e a cabeça. 
Pense mais um pouco nela.
Adicione sal, e uma colher de saudade. 
Espere por 20 minutos. Ou uma noite, 
até que ela retorne.

Seu arroz está pronto. 
Você não.

EQUILÍBRIO

Equilíbrio é isolar-se
para manter os amigos por perto
É dormir o dia inteiro
e amanhã não pregar os olhos
É fumar o último cigarro
e depois o primeiro
É começar e não terminar
É terminar sem começar
É aprender algo velho
e desaprender algo novo
Equilíbrio é empurrar um prato
que mal cabe no seu estômago guela abaixo,
beber e vomitá-lo pela rua
É estar com você
quando não estou
e não parar de escrever
mesmo quando a tinta acaba
ou a comida
ou a água
Contemplar sóis à noite
Equilíbrio é morrer
Depois de ter vivido.

PÁGINA EM BRANCO

Escolhi ser um nada
porque aí eu poderia ser tudo
Virei a página em branco
que contempla o suor de Kerouac,
a solidão de Bukowski,
um uivo
um almoço nu
Algumas memórias póstumas
de um incidente em Antares
Sou aquele nada constrangendo um beijo
Um domingo, ou uma segunda-feira
Sou aquele vagabundo excluído,
o voto em branco da sociedade,
a ressaca que martela mentes vazias.
Eu gosto de ser um nada
porque decidi não escolher
e essa foi minha única opção
E sendo nada eu virei espaço
Agora estou pronto para preencher-me.

SORRIA

Um cara qualquer anda pela rua, apressado
De tanta pressa, esqueceu-se de me ver
Acabou trombando comigo
Papéis voaram pela rua
Fugindo da gente como pássaros
gritando por liberdade
Mal sabiam eles
Que seu dono era o escravo
E no fim, o homem me sorriu
Um agradecimento
Talvez o único sorriso que aquela pobre alma
Irá sorrir neste maldito dia
Nesta maldita cidade
E que depois venham os pecados da noite
Para lavar nossas almas
Depois de as entregarmos
Para um babaca que nos paga
O dinheiro do próximo trago
O verdadeiro sinal
De que estamos bem

Estamos bem, não é?

BEM-VINDO AO CAOS

Você está na rua
Xingando todas essas
Bocas mal-beijadas
Uma seda, um copo
Do que mais precisa um homem
A não ser de uma noite a mais
Você está na rua
Bebendo vodkas blasés
A calçada é sua privada
E você questiona
“Onde estão meus amigos?
Temos ainda todas as noites pela
frente!”
Os loucos são medíocres
Quando tentam ser normais
E eles não te esquentam
Não queimam
Você está na rua
E alguém está dormindo
Não deveria ser assim
Mas quem você pensa que é
Para contrariar o caos?

COMO CONTROLAR O MEDO

Não o controle. Deixe-o livre.
Sinta cada gota dele suar
pela tua pele.
Olhe pra você mesmo
e se sinta ridículo, se possível.
Isso ajuda.
Agora faça. Mesmo com medo.
Estraçalhe-o com atitude.
Tenha em mente que tudo muda.
Você está vivo.
Você pode falar em público.
Você pode roubar um beijo.
Você pode andar na rua à noite.
Viva livre ou tenha medo
Se tudo der errado, a culpa é sua
E não há nada melhor
do que ter responsabilidade
Pelo o que acontece contigo
Vire quem você pode ser.
E o medo, coitado,
Não saberá com quem está mexendo.

AMORZINHO

Eu tentei falar de amor
Mas me engasguei com whisky
Tentei escrever seu significado
Com fumaça
Talvez seja melhor eu
Lamber seu corpo
Até que você ame
Poemas não servem
Para falar de amor
Se você pensa no que escrever
Eu tentei falar de amor
Mas não quis interromper seus gemidos
Uma mosca só tem
A própria sujeira e
As asas para cortar a noite
Enquanto a morte não vem
E se você deixá-la fazer isto
Então você sabe
O que é
Amor.

AVC – AMADO VELHO COMPANHEIRO

Meu velho cai:

“Sorria. Levante os braços. Diga uma frase”

E ele: “Merda! Não é AVC! É hora de ir…”
Já estavam fechando o bar
e nós pararíamos de esquecer a vida.
Amanhã é dia de ressaca
Refri de limão e doses de domingo
Pra consertar o estrago.
Só não sabemos consertar
esta maldita agonia
que a realidade nos força a engolir
Mas temos um ao outro.
Quatro pernas bêbadas são iguais
à duas sóbrias
“Tchau. Eu te amo, filhão”
“Eu também”
Ele deve ter orgulho de mim.
Eu já aprendi como apanhar de tudo.
Já sei ser metade do homem
que ele sempre será.

EM QUEM CONFIAR

Estamos presos
Nos nossos olhares
No nosso andar
Na roupa que vestimos
Estamos tão engasgados
Com uma maré de fúria
Que culpamos a platéia
Que nos julga, com suas personas
Mal vestidas e clichês
Tem alguém que abre um sorriso
E se diz longe das amarras
Enforca-se na própria ideologia
Me diga com quem você anda
Que eu te direi
“Ande mais”
Estes que não ligam para sua ressaca
Estes, e somente estes
Merecem respeito
E um pouco
De amor.

UM BRINDE

A vida é mais tragável quando você bebe. A janela do meu quarto ganhou um tom de carvalho. E eu gostava daquilo. Antes era marrom merda. Agora era carvalho.

A cama, bagunçada, ganhava um ar poético. “Na minha cama deixo minhas bagunças”, ou “bagunçaram minha cama e foi bom”, ou qualquer frase do gênero.

E dá-lhe whisky. Bebemos para saborear e bebemos para enlouquecer. Eu me sentia muito bem quando fazia os dois ao mesmo tempo. Começava com leves tragos: “bom whisky!”, eu pensava sobre aquela garrafa de 10 reais. E ia beijando o copo de pouquinho em pouquinho, como o corpo de uma mulher. Quando eu percebia que a vida é triste, o corpo de mulher se transformava em remédio. E quando a garrafa estava quase acabando, eu me dava conta que a janela tinha mudado de cor.

COMPANHEIRISMO DE PRAZO DETERMINADO


UM CÃO


Começou a tarde fuçando no lixo daquele mercado descendo a rua. Encontrou algumas frutas. Estavam ótimas: sem mau-cheiro, machucados ou partes podres. Após comê-las, seguiu rumo ao mundo.

A tarde, então, ficou vazia. E ele olhava o pouco povo caminhar em suas linhas (estreitas), sem entortar o olhar para sí. Um outro, de bom coração, deixou-lhe os restos de uma marmita. Havia arroz, batatas e cenouras cozidas. Agradeceu ao bom moço da maneira que pode. Afinal, era só mais um cão que bebia cachaça e mijava no próprio corpo para não morrer nas frias noites de Junho. E assim, sem mais, o moço se foi, sumindo no emaranhado de esquinas. E o cão, de destino traçado, sentiu um aperto no peito após a generosa refeição.

Deste dia em diante, ninguém mais viu (nem fingiu que não viu) o cão que virava latas em trocados.

A AVENIDA É UMA CRIANÇA

O túnel se estendia por quilômetros abaixo da avenida,
o qual era um amontoado de luzes brancas
e vermelhas.
O som era de gente, de jazz,
de estilo e histórias.
Tudo coberto pelo manto negro da noite.
Como uma garota que faz uma cabana
com seu cobertor e brinca com uma lanterna.
Os postes eram a lanterna.
Os anúncios eram a lanterna.
Os cigarros eram a lanterna.
E as janelas, ao longe,
escondendo as histórias mais belas,
as famílias que dormem cedo e
os amigos que nem dormem.
O casal que se ama
encostado na parede do imponente shopping.
Os mendigos sentados, existindo.
E eu, vendo a arte nascer
de cada concreto
que forma esta paisagem.
Se a cidade é nossa pequena filha
que tipo de pai nós somos?