A tarde tava em miúdos
como o resto do dia.
Seu gosto era de
plástico queimado.
As sonecas foram pra ver se
tudo acabava mais rápido.
Lá do telhado vi gente na rua,
distantes igual a lua.
Parecia que a vida só ocorria
à eles.
Meti-me num vácuo sádico
que roía a alma aos poucos.
Já não havia quase nada
dentro de mim, e as notícias
pairando nas ondas sonoras
em nada ajudavam.
Pessoas morrendo e
eu expirando ingratidão.
Foi quando o bem-te-vi
pousou na antena do vizinho.
E então houve só o bem-te-vi.
Só seu bico coçando suas
penas amarelas.
E as suas patas no ferro,
e o céu no fundo.
O bem e o mal sumiram.
A dor e o prazer sumiram.
Um vento de chuva pincelava
minha pele.
E por um momento, silêncio.
Não no mundo; em mim.
Aí o bem-te-vi voou.