As gotas amplificadas no último volume,
caindo no meu telhado e
solando uma melodia impossível, mas
tão comum e, mesmo assim, tão
doce que você esquece que
está numa multidão.
Meus cigarros aplaudem a atração.
Há alguém comigo aqui,
alguém que um dia foi uma promessa.
Sua voz está distorcida e,
de algum modo,
percebo o quanto estamos distantes.
Pare de gritar no meu ouvido a
sua errônea concepção de
quem você queria que eu fosse.
Eu não sou suas expectativas e
nem mesmo sou as minhas.
Sou só um cara que procura a
felicidade
em todos os cantos possíveis,
em todos os shows e
em todos os erros.
A chuva abaixa o volume.
Agora eu posso escutar com clareza
o quanto estamos roucos de tanto
discutir algo que já está morto.
Acho que preciso sair, dar uma volta e
encontrar um pouco de esperança
nos olhos vermelhos que me
pedem um trocado.
Não tenho hora para voltar, e
isso pode até virar
algo produtivo.
quinta-feira, 8 de dezembro de 2016
ESPETÁCULO
DEVERES
Hoje eu levantei e
não quis conversar nem comigo mesmo.
O espelho me olhou e disse:
"Bem que você poderia melhorar essa cara".
Joguei água no meu rosto, desisti e
molhei meu corpo inteiro.
Hoje é dia de sair de casa e
encarar pessoas.
Abri meu armário de máscaras e
peguei qualquer uma que me servisse.
Acabei pegando a do poeta de sorriso fácil.
Não dá pra sair na rua sem uma máscara
porque o sol e as pessoas emitem
radiações perigosas para nossa
pele frágil.
Cumprimentei um vizinho, e o
céu estava parcialmente nublado.
sábado, 12 de novembro de 2016
METRALHANDO AS PESSOAS COM POEMAS
Elas representam sentimentos,
ou pelo menos tentam.
Elas são teimosas, e ficam saindo
da minha cabeça,
principalmente quando eu
tô na merda.
A questão é que eu sempre acho que
estou na merda, então as palavras
saem como balas e perfuram
o crânio de tudo aquilo que
tenta me destruir.
Eu tô armado.
Que venha o apocalípse.
TALVEZ O PROBLEMA SEJA A FALTA DE DOPAMINA
Oh, droga! O que eu devo fazer?
Todo dia é uma guerra para
simplesmente levantar da cama.
Só isso, e eu já levanto exausto.
Já busquei a porra da felicidade
em cada canto dessa cidade imunda,
e eu só vejo destruição.
Eu tento sorrir.
Eu juro que tento.
Contraio os músculos da face e
assisto vídeos de gatinhos.
Chego num ponto em que
nem sei mais qual é o problema.
Nada me satisfaz.
Não quero tomar remédios.
Não quero procurar ajuda.
Não quero mais nada além
de um cigarro.
Levo uns dois, três minutos para
fumar um.
Quantos cigarros terei de fumar
até que o dia acabe?
sexta-feira, 11 de novembro de 2016
MANIFESTO EM DEFESA DA ARTE, DE QUALQUER EXPRESSÃO DAS CRIATURAS QUE POSSUEM CORAGEM SUFICIENTE PARA ENCARAR O ESCÁRNIO.
Sobrevivo hoje porque tenho pessoas maravilhosas ao meu redor. Pura sorte. Elas ainda acreditam que eu vou dar a volta por cima. Muitos artistas não têm essa sorte, e morrem no meio do caminho enforcados num uniforme ou numa gravata. Assassinados por diplomas de contabilidade, administração, publicidade e outros.
Nem a chuva ajuda. Ela limpa o ar e as calçadas, fechando as portas de quem trabalha na rua. Você olha pro céu e pensa "porra, Deus, por que hoje?". Então você acende um cigarro e caminha sem guarda-chuva por aí, pensando em que tipo de emprego você se daria bem.
Nessas horas a Arte está correndo risco de vida. Ser artista é uma constante fragilidade. Até a fama pode destruir um dos bons. E eu vejo nos grupos os iniciantes, ainda com aquela chama, aquela esperança de que viver bem é viver artista.
Um dia, eu sonho, os poemas serão moedas de troca. Uma cerveja custará um poema e meio. Uma casa custará um livro. E não só os poemas, mas como qualquer expressão verdadeira. As pessoas finalmente entenderão que a vida sem Arte não vale a pena. Onde encontrar beleza numa barata despedaçada num bueiro? Ou no limo de uma escada velha? Ou no seu amor, tirando a roupa na sua frente, enquanto você escuta a garoa caindo lá fora?
Os artistas são abridores de mente. O papel deles é dizer "olha, isso aqui é belo, é profundo, é um sentimento". O ser humano vê a vida cinza por natureza, e toda cor é uma poesia.
Não defendo arte ruim. Há várias por aí. Existem os pilantras, os falsos poetas. Se fantasiam de "artistas" e jogam qualquer merda na cara das pessoas. Que se foda este tipo de lixo. Se não há sangue em cada letra,
em cada passo,
em cada traço,
em cada acorde,
em cada pedaço,
então não é verdade.
Algumas pessoas conseguem até viver de mentira. É mais fácil do que parece. Basta você julgar sua vida baseando-se nos padrões que você vê por aí. Ter medo do ridículo é viver de mentira. Ter medo de ser você é viver de mentira. Viver sem arte é viver de mentira.
Eu pensei que seria bom me ver na merda com sessenta anos. Mas, talvez, se pequenas coisas mudarem, isso não será necessário. E enquanto meu corpo não apodrece, eu continuo gritando.
Parabéns para nós.
segunda-feira, 17 de outubro de 2016
UNHAR
eu tomo banho.
Minhas costas são feridas abertas.
Dizem que marcas de arranhões,
se muito profundas,
não cicatrizam nunca mais.
Meu corpo tá todo carimbado.
O gosto da sua boca tá
na minha.
Sua lubrificação grudou na garganta.
Um evento raro que só acontece
uma vez por ano.
Agora eu tô só, e ela também.
Amar e fazer amor são coisas
totalmente distintas,
mas ninguém sabe
diferenciar, afinal.
Não me culpem.
AMADURECIMENTO
O bar tornou-se seu amigo.
Todo mundo te julga.
Estão te observando.
É melhor não passar vergonha.
O que vão pensar de você se
você vomitar numa lata de lixo ou
andar sem as calças por aí?
Quando você podia jogar
a culpa em alguém,
tudo era fácil.
Agora a culpa é sua.
É sua responsabilidade batendo na porta.
Você não vai atender?
Ela deixou um recado pra você.
Conta de luz.
Não dá mais para ir ao cinema
ou comprar um milkshake no
shopping.
Fique na sua casa.
Envelheça, amadureça e
apodreça.
Os fungos cuidarão de você.
terça-feira, 23 de agosto de 2016
ANTES DA ABORDAGEM
Sei lá, pode ser uma mania ou
uma certa falta de comprometimento,
mas hoje eu decidi almoçar dois pães franceses.
É mais barato do que uma coxinha, e
quase tem o mesmo sabor se
você souber lidar com as merdas que te acontecem.
Pedi azeite numa mesa de um restaurante,
abri o pão no meio, reguei com oliva e
o casal me olhou como dois gatos
te olham enquanto você os aperta.
Eu podia ter comprado uma esfiha, ou um
pacote de amendoim, mas estas coisas
não te sustentam enquanto você aborda
estranhos, com seus problemas e suas
conversas e os beijos.
Caminhei então pelos vãos, pelo meio da
avenida, me desviando dos carros e
dos maus pensamentos, enquanto ácido
gástrico corroía 200g de fermento e farinha.
Eu podia ter comprado um maço de
Minister, fumá-lo de uma só vez e
rezar para que tudo passasse logo, mas
o tempo não nos escuta na sua correria.
"Olá, boa noite! Estou dando poemas
para as pessoas com quem eu vou
com a cara..."
domingo, 21 de agosto de 2016
DOPADO
Começou quando eu tinha problemas, e ela também, e nossos problemas se gostaram. Tudo por causa de alguns olhares trocados num vagão frio do centro da cidade. Eu tava na merda. Não queria falar com ninguém. Mas ela me olhou, e isso me causou medo e arrepio e ao mesmo tempo uma esperança de que as coisas mudariam. Entreguei um de meus poemas eróticos para ela e a convidei para uma cerveja. Ela aceitou, e eu esbocei um sorriso de verdade.
Na chuva, dividimos a sombrinha dela. Eu odeio ter de desviar das pessoas na rua, odeio as pessoas na rua, mas ela começou a dançar com seu vestido florido e seus cabelos curtos alaranjados, e eu nem sequer pensei sobre o mal que nos habita. Babando em alguns cigarros, pedi um litrão. Ela não bebe. Só está alí porque eu a convidei e ela é uma boa louca. Uma criatura rara que você só encontra uma vez na vida (uma criatura rara e que existe, não essa merda virtual dos dias modernos).
Seus olhos mudavam à medida em que nos abríamos. É bom conversar sobre coisas tristes, sobre nossos pais e nossos medos. Sobre tudo o que odiamos, e o nosso ódio se combina majestosamente. Ó, minha rainha! Poderia ficar a noite inteira só olhando para seus lábios, desejando chupá-los até extrair o melhor de você. Poderia ficar uma vida escorado ao seu lado, vendendo meus poemas e ansiando nossa ansiedade. E suas pernas! Ah, suas pernas! Me dê um pouco delas! Seu vestido florido levanta às vezes, e eu não consigo desviar o olhar. Ela também não fuma e recusa meu cigarro. Estamos mais próximos agora, física e espiritualmente, embora não acreditemos em espírito. Mas há algo além, algo que nos faz olhar dentro de nossos olhos por um minuto, e os olhos delas adquirem um tom de mel, e eu lasco-lhe um beijo sedento. Seus lábios se encaixam perfeitamente aos meus, como um quebra-cabeças de 500 peças.
Nos escondemos num canto da cidade e, por algumas horas, nos amamos. Talvez não seja amor da forma que todos conheçam, mas na realidade ninguém conhece o amor. Só nós dois conhecíamos naquele instante, e somente naquele instante queimamos como todo ser humano deve queimar em sua vida. O fogo é tão grande que incendeia os prédios e os lençóis e o rosto murcho da depressão. Em pouco tempo, sabemos a cor da nossa alma.
Depois da chuva cessar um pouco, nos separamos. Cada um volta para o seu canto, e eu não consigo pensar em mais nada. O nariz dela, a orelha, a boca, o sorriso, os cílios, os joelhos, as mãos pequenas, as mãos dela analisando as minhas e todos os detalhes vividos entre um beijo e outro, entre uma pílula e outra engolidas à seco.
Me sinto dopado. E não só sinto; estou. Tenho pouco tempo de vida. A medicação já não faz mais efeito. Meu coração apodrece à cada segundo, e não há mais um poema para escrever. Bem que me disseram para maneirar, mas isso aconteceria de qualquer jeito mesmo. E ela vem, a doce morte, beijar meus lábios novamente, como os franceses chamam: La petite mort.
quinta-feira, 18 de agosto de 2016
MASTURBE-SE
O que você quer fazer
(e já faz, mas diz que não),
é tão comum quanto ir ao shopping de domingo.
Cortar o cabelo é masturbação.
Vestir roupas novas é masturbação.
Autoestima é masturbação.
Mas tudo isso não faz você ficar
com as pernas bambas.
E nada disso te faz conhecer-se melhor.
Você aí, que não conhece sua própria buceta,
como você quer que um desconhecido, que
mal sabe quem você é realmente,
consiga te chupar direito?
Se nem você se ama, por que outra pessoa
deveria amar?
Tá entendendo como a coisa é profunda?
Não é "coisa de quem não transa".
Tudo bem, você pode se sentir só às vezes.
Mas quem aqui não vai morrer só?
Segure-se, massageie-se, enfie
dois ou três dedos, imagine aquela
sua ex que era boa de cama.
Só pare de proliferar tabus por aí.
Ninguém precisa disso.
SOBRE SER ONLINE
Não me mandem mensagens, a não ser que
você tenha um pouco de você
para me dar.
Ou se quiser me dizer onde você
estará daqui a duas horas.
Conheci pessoas maravilhosas por
estas ruas à noite, e essas mesmas
pessoas maravilhosas se preocupam
demais em:
- adicionar no Facebook;
- número de telefone;
- selfie.
Não! Não! Eu imploro!
Qual foi a última vez que você
conversou realmente com uma pessoa, e
não com uma máquina que responde
10,20,30 contatos ao mesmo tempo?
Sinto saudade do toque, do hálito de
cigarro e cerveja, dos abraços,
de quando alguém ia com a minha cara e
sentava no meu colo.
Não percam sua humanidade e o seu estilo.
Você não possui 100% de bateria e
algumas tomadas.
Se for pra conversar comigo neste
mundo que não existe,
pague-me um litrão no mercado do chinês.
quinta-feira, 28 de julho de 2016
O PALCO
Não existe um roteiro e nem um diretor. É tudo improvisado, no caótico set das calçadas sujas. Você vai conhecer um puto ou outro que até dá um parecer que as coisas mudarão. Mas você sabe qual o papel dele. E você aplaudirá todos os seus erros e vexames, olhando para seu reflexo mórbido no espelho sujo do seu quarto minúsculo.
E o show tem que continuar. Luz, câmera e um trago num cigarro de quinta. Agora tudo está claro; muita merda para todos. Nós não limpamos a frente dos nossos teatros e cinemas. Deixamos que o lixo se acumulasse. E as moscas...
Às vezes esquecemos nosso personagem. Quem devemos ser? O que temos de dizer? Então uma propaganda atrás das cortinas te sussurra: "beba Coca, use Nike, compre Samsung".
Bem, está tudo ok agora.
ESCREVER DE VERDADE
estou feliz.
As coisas boas estão acontecendo e
eu não consigo evitar.
E há uma semana que eu não escrevo.
Quando tento, sai uma
bosta.
Vê, tô até tentando com este daqui,
mas você reparou que falta algo?
Falta sangue.
Falta dor.
Faltam as palavras certas.
A alegria é uma péssima poetiza.
É enfadonha, exagerada, cheia de
falsos lirismos para se engrandecer.
Se você quer escrever, esteja fodido.
Sozinho.
Só assim você escreverá de verdade.
Enquanto você estiver feliz, vá curtir.
Vá lamber a genitália de alguém.
Lá fora as pessoas precisam de
alegria para esquecerem
suas próprias agonias.
Aqui dentro só resta esperar
que essa euforia passe.
sexta-feira, 15 de julho de 2016
DIA DE CÃO
enquanto a garota com quem eu estava
me perguntava:
"Você prefere ficar com aquela vadia
do que comigo?"
"Aaaaah!"
Um dos cães levou um pedaço de
jeans para a calçada.
"Responde!"
"Amor, eu tô meio ocupado aqui..."
"VOCÊ NUNCA TEM TEMPO PARA MIM!"
Outro cão me soltou, levando um bife meu
para o jantar.
A garota foi se afastando, batendo os pés com força
no asfalto, que não tinha culpa de nada.
O terceiro cão largou minha perna
(o que sobrou dela), e me disse:
"Cê tá ferrado", e foi embora.
"Volta aqui, amorzinho, vamos conversar".
Ela não me dava ouvidos.
Decidi voltar para os cães.
sábado, 2 de julho de 2016
SEM SABER
Lamba o nada, deixe-o babado.
Vão te dizer que está louco, e
apertarão as alças da sua
camisa-de-força.
Uma pílula por dia de qualquer coisa.
Engole quente, ao molho de pinga,
Quatro reais no boteco do alemão.
Tropece algumas vezes; as calçadas
esburacadas pelo desdém
dançam com seu equilíbrio.
Sem saber,
sem saber de nada,
você decora a terra com seus ossos.
O rastro de merda deixado para trás,
cada minuto gasto com
pessoas que você odeia para
conseguir coisas inúteis;
tudo passa.
Agora só falta esperar pelos
vermes.
quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016
QUANDO O PERFEITO NÃO DÁ CERTO
domingo, 14 de fevereiro de 2016
O HOMEM E A BICICLETA
segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016
CARNAVALISMO
quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016
O QUE DEUS FALARIA PARA VOCÊ CASO FOSSE UM ESTRANHO NO ÔNIBUS
segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016
AUTORRETRATO
domingo, 24 de janeiro de 2016
A FÓRMULA PARA SER HOMEM
segunda-feira, 18 de janeiro de 2016
DECISÕES
quarta-feira, 6 de janeiro de 2016
VALE A PENA SE APAIXONAR?
SOBRE ESTILO DE ESCRITA
domingo, 3 de janeiro de 2016
RESPEITE OS MAIS VELHOS
Se Allen Ginsberg fosse meu amigo,
Eu estaria preso agora.
É bom poder falar de
Cus
Abertamente.
Falar de maconha, de duas garotas
Que se transam.
Os beats tinham o mundo, mas
O que queriam era censurado.
Queriam botar os pés na estrada e
Falar sobre drogas, jazz e o resto você
Já sabe.
E escrever sobre tudo.
Você pode cortar a cabeça do presidente,
Pode dar a bunda,
Pode vomitar nas seringas,
Pode ser obsceno, obscuro, observar o
Trem carregado de seios e
Vaginas.
Assistindo um presidente atirar no
Próprio coração.
Depois um vai-e-vem, e então
Expulsaram a liberdade para o
Lado de lá do oceano.
Os artistas tinham colhões e
Janelas quadradas com
Barras de ferro.
Tudo só acabou por que
Faltava dinheiro.
Temos heróis em território nacional
Também, mas aqui as pessoas
Preferem a televisão.
E eu prefiro assistir Dostoievski
Nas puras páginas dos seus
Livros sujos.
Não gosto de Hemingway, me desculpem.
Gosto da sua espingarda.
Os Veríssimos são ok,
Machado fez sua parte,
Mas eu sou meio Drummond.
Solitário, mas todo lobo
Uiva para a lua.
Hoje ela não está na moda e os lobos
São castrados e viram vídeos para a
Internet.
Mas no beat errado.