Ela estava sentada no sofá e
a sala era papéis, contas, fotos.
Tudo espalhado
no chão, colo e teto.
Era o fim dos entulhos.
Apocalipse do lixo.
Mesmo assim,
sempre acordo de mau humor.
As palavras não saem.
Simplesmente ficam sentadas
entre o estômago e o esôfago.
Algumas escapam em formato peido.
Ela começou a falar.
Mostrou os desenhos que fiz
quando tinha 4 anos.
Fotografias de infâncias esquecidas.
Esperava uma reação;
eu só esquentei o café e
comi bolacha de maizena.
Poderia ter mudado o mundo,
destruído a humanidade,
ter dado um "bom dia".
Só fiquei com a boca cheia.
Tava cedo demais pra existir.
Ela sabia disso mas
uma criatura tão
magnífica
tem pressa de dizer e viver.
Isso pois tenho sorte.
Nunca correspondo.
Olhei pra fora e percebi que
era mais um dia sem eu
ser melhor.
E ela continuava me amando.