segunda-feira, 25 de agosto de 2025

NÃO HÁ CERTEZAS NESSA VIDA

talvez eu precise me defender
dos meus gostos
eu gosto
de estar com quem
tem gosto de destruição

talvez eu precise pensar mais
sobre como pensar menos
me faria ter pensamentos
melhores

talvez eu precise beber menos
pra poder ficar bêbado
com menos bebida
e ser a coisa extrovertida
que todos os introvertidos
desejam ser

talvez eu devesse andar mais
na minha quebrada
pra poder ficar parado
numa mesa gourmet do centro
e bater com orgulho no peito
"eu sou de onde ninguém veio"
enquanto me esqueço
de todos os trens e ônibus
de volta pra casa

talvez eu volte pra casa
talvez sóbrio mas sempre bêbado
talvez eu lembre de hoje
talvez eu me esqueça

até que "talvez" soe tão estranho
quanto suas certezas
tão incertas
que eu preferi apostar tudo
no acaso

até que o incerto 
seja o papel correto
de quem já abraçou
a própria loucura
e a loucura residente das ruas
e a loucura que vem
quando ser normal
é uma sentença

talvez
até a próxima
talvez

POEMA SEM TÍTULO 1

alguém que sonhe 
o que acordo
pra sonhar

ruas tão desertas
cheias de gente
eu converso seus vazios
como se me completasse

num escuro
que talvez consuma
toda noite
há o clarão do isqueiro
e mais um copo
para mergulhar
pensamentos que nem processei
eu sei
errei na onde acertei

não sei se vou parar
mesmo com o vendaval
talvez eu flua
pra onde te encontro
teu sorriso e pronto
tudo se mexe
pra alguma coisa boa
que me faça uma pessoa
poucas porcentagens melhor.

IDEOLOGIA QUÂNTICA

é sempre a merda mais simples
que me faz sorrir
quando todas as nuvens do dia
forçam a gravidade dos meus lábios
para baixo

levantei da cama
e arrumei minha casa

passei pano
em todo canto
colunas e mente
a sujeira grudando
nos fiapos do que sou
a água no balde fica turva
quase que não me vejo
só enxergo pó
e traumas
mas o brilho da superfície
é o artífice
olha a arte limpa que faço
com minha podridão

e se a gente pudesse
sair por aí
como se existir
fosse a única missão
dos nossos átomos

eu existiria

pra caralho.

CARDÍACO SENTIMENTO

meu coração tá embalado
meu coração tá pronto pro churrasco
te prometo
que só estou podre por dentro
se você for me devorar
minha casquinha tá crocante
seca como qualquer outra solidão

não tenha dúvida
a gente pode correr contra
a correnteza
e se arrebentar nas nossas ondas
só espero que tenha alguém
olhando nossas mochilas

vamos para lugares do lado de fora
além das nossas mentes derretidas

eu não tenho mais idade
e nem mais fé
mas vamos ficar bem
eu acredito
eu te prometo

meu coração tá embalado
é no vácuo das ausências
que eu pulso minhas feridas

e o pulso ainda pulsa.

segunda-feira, 18 de agosto de 2025

BOA VISTA


poucos veem o céu quando olham para cima
veem o que vem à mente
não aos olhos

se são realmente poucos
não posso confirmar
com a mesma certeza
do que sinto
mas são muitos
os que vejo
olhando para cima
sem sorrirem

isso quando olham
para qualquer outro lugar
que não o chão
ou o próprio reflexo
nas poses da autoimagem
como se outros bilhões
também não se espelhassem
para ninguém se importar

toda vez que vejo um bem-te-vi
eu assobio
quase nunca tenho resposta
ele continua bem-nos-vendo
e eu o vejo

eu realmente o vejo

VELHO POETA LAMBENDO A PRÓPRIA FERIDA

os tragos tem o mesmo gosto
daquela sua depedida
nada muda quando está enterrado
nada errado 
nas proporções de um coração
dilacerado
queimo o dedo fumando bitucas
corroídas de frieza
é sobre o que quero que desapareça
quando te lembro
não cabe nos pulmões
nas arestas mofadas
do que me tornei

já fui rei
do meu domínio
não significo
nenhuma etiqueta
caminho para aquilo que pareça
apenas um dia melhor que ontem
um pouco mais pobre
um pouco mais velho
tudo o que sinto
é mero acaso
caso ainda não tenha percebido