quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

SÓ DAR O SINAL

me mostre mais sua pele
e o que há debaixo dessa roupa.
me mostre o que suas paredes
sabem,
o seu tom de voz em êxtase.

hoje queria suar contigo.
queria arfar e gemer e gritar.
marcar sua bunda
dar tapa na cara
xingar e repetir. 
te chuparia todos os pelos.
te sorriria, um dentro do outro
um lambendo o outro
um corpo pro outro
como se fosse a última vez.

só dar o sinal
que a gente foge desse povo chato
dessa noite chata
desse vazio cheio de nada.

me mostre mais sua pele
e seus buracos.
me mostre suas falhas;
quero me esfregar nelas
até que a gente esqueça
que somos perfeitamente
imperfeitos.
que temos contas
que muita gente é contra
que nossa felicidade 
para alguns é uma afronta.

é, até que a gente se esqueça.
até que as horas e os minutos sumam.
até que o sol venha nos espiar.

só dar o sinal.
eu espero
mordendo meus lábios.

LARGANDO O QUE NÃO SOMA

olha, foi uma honra
participar dos nossos erros.
mas é que a vida confronta
até aqueles que estão parados.
e eu não quero ficar parado
discutindo certo e errado
perdendo tempo com o que não soma.

meu relógio tem voltas finitas
e as últimas eu vou perder de vista.
então não insista;
minhas asas tão coçando pra voar
mesmo que eu voe direto pro muro.

eu também poderia provar algo
pra todo mundo.
mas veja só: ninguém leva medalhas
pro túmulo.
então que digam
aquilo que sou e que não sou.
a gente fala demais e
o silêncio é absoluto.

no mais, você sabe meu endereço:
planeta Terra
zona leste da Via-Láctea. 

SORRIR É UM ATO DE REVOLTA

ah se vão te cobrir os sonhos!
você mesmo vai se botar pra baixo
de vez em quando.
se sofrer é inevitável
sorrir é um ato de revolta.
manter o sorriso é vitória.

a gente sabe calcular 
a massa das estrelas
mas não sabemos
medir nossas palavras
ou a distância entre nossas almas.

já dissemos facadas e burrices.
escutamos ultraviolência.
perdemos alguns pedaços
no xadrez da morte.
e a gente tem que se virar
com nossas cartas marcadas.
olhar pra trás é ainda ver
a estrada em chamas.

quantas tolices 
meus copos aguentaram?
só sei que passamos 
por aquilo
que não nos destruiu
(e olha que tentaram).

ah, se vão te desacreditar!
você mesmo pode não confiar
nos próprios pés e na própria
ambição.
é difícil e absurdo.
maçante e infinito.
é por isso que repito
mantenha esse sorriso;
sorrir é um ato de revolta. 

PROCESSO CRIATIVO

comecei pela caipirinha
e a primeira não funcionou
então tentei a segunda
e a terceira.

escrevi alguma coisa sobre
não saber se a minha chatice
e meu nojo pelas coisas que eu amava antes
eram sinais de sabedoria e iluminação
ou apenas velhice.

o poema ficou muito comprido
para vendê-lo na rua.
as pessoas não têm tempo pra poesia.
ela precisa ser tão rápida
e digerível
quanto seus relacionamentos.

a caipirinha fez efeito e eu fui pra cama
às 4 da tarde
rezando para que eu não perdesse
a noite inteira
sonhando com meu passado.

acordei às 7 da noite.
comprei um chocolate em pó
e esquentei leite no microondas.
aqui eu já havia desistido
de ser o artista autodestrutivo,
o rebelde alcoolatra,
o periquito sem asa.

queria apenas pão com manteiga
e chocolate quente
e as minhas gatinhas
dilacerando baratas.

sentei minha bunda na cadeira
e maltratei o teclado
até que saísse alguma coisa
da gente.

sábado, 6 de janeiro de 2024

NADA NOVO

não é porque o mundo
girou noutras pessoas
e dançou balé oval pro sol
que automaticamente
e imediatamente
tornei-me alguém melhor.

ou pior;
ganhei uma nova chance.

chances novas eu tive
todos os dias
e todos os minutos
e não só
na volta arbitrária da Terra.

não vou ficar de promessinha
dizendo que vou experimentar
novos sabores da gente.

nada novo.

continuo sujo
sobrevivendo nos macetes
assim como a sujeira
que varri pra debaixo dos tapetes.

se pareço ranzinza
enquanto todos têm esperança
saiba que eu 
meti minha esperança no rabo
e saltei foguetes pelo abismo.