quinta-feira, 28 de julho de 2016

O PALCO

Somos todos personagens de um filme ruim. Não tem final feliz. Não tem música de fundo. Não há beijos ritmados e nem um vilão que vira mocinho. Fazemos nossa parte, falamos nossas falas e voltamos para nossos trailers sujos. Trailers feitos de todas as decepções pregadas com nossas feridas. Não tem como escapar; apenas dormir e atuar no dia seguinte.

Não existe um roteiro e nem um diretor. É tudo improvisado, no caótico set das calçadas sujas. Você vai conhecer um puto ou outro que até dá um parecer que as coisas mudarão. Mas você sabe qual o papel dele. E você aplaudirá todos os seus erros e vexames, olhando para seu reflexo mórbido no espelho sujo do seu quarto minúsculo.

E o show tem que continuar. Luz, câmera e um trago num cigarro de quinta. Agora tudo está claro; muita merda para todos. Nós não limpamos a frente dos nossos teatros e cinemas. Deixamos que o lixo se acumulasse. E as moscas...

Às vezes esquecemos nosso personagem. Quem devemos ser? O que temos de dizer? Então uma propaganda atrás das cortinas te sussurra: "beba Coca, use Nike, compre Samsung".

Bem, está tudo ok agora.

ESCREVER DE VERDADE

Bem, há uma semana que eu
estou feliz.
As coisas boas estão acontecendo e
eu não consigo evitar.
E há uma semana que eu não escrevo.
Quando tento, sai uma
bosta.
Vê, tô até tentando com este daqui,
mas você reparou que falta algo?
Falta sangue.
Falta dor.
Faltam as palavras certas.
A alegria é uma péssima poetiza.
É enfadonha, exagerada, cheia de
falsos lirismos para se engrandecer.
Se você quer escrever, esteja fodido.
Sozinho.
Só assim você escreverá de verdade.
Enquanto você estiver feliz, vá curtir.
Vá lamber a genitália de alguém.
Lá fora as pessoas precisam de
alegria para esquecerem
suas próprias agonias.
Aqui dentro só resta esperar
que essa euforia passe.

sexta-feira, 15 de julho de 2016

DIA DE CÃO

Três cães de rua mordiam minha perna
enquanto a garota com quem eu estava
me perguntava:
"Você prefere ficar com aquela vadia
do que comigo?"
"Aaaaah!"
Um dos cães levou um pedaço de
jeans para a calçada.
"Responde!"
"Amor, eu tô meio ocupado aqui..."
"VOCÊ NUNCA TEM TEMPO PARA MIM!"
Outro cão me soltou, levando um bife meu
para o jantar.
A garota foi se afastando, batendo os pés com força
no asfalto, que não tinha culpa de nada.
O terceiro cão largou minha perna
(o que sobrou dela), e me disse:
"Cê tá ferrado", e foi embora.
"Volta aqui, amorzinho, vamos conversar".
Ela não me dava ouvidos.
Decidi voltar para os cães.

sábado, 2 de julho de 2016

SEM SABER

Lamba o nada, deixe-o babado.
Vão te dizer que está louco, e
apertarão as alças da sua
camisa-de-força.
Uma pílula por dia de qualquer coisa.
Engole quente, ao molho de pinga,
Quatro reais no boteco do alemão.
Tropece algumas vezes; as calçadas
esburacadas pelo desdém
dançam com seu equilíbrio.
Sem saber,
sem saber de nada,
você decora a terra com seus ossos.
O rastro de merda deixado para trás,
cada minuto gasto com
pessoas que você odeia para
conseguir coisas inúteis;
tudo passa.
Agora só falta esperar pelos
vermes.